Manipulação da Informação

Em Portugal a apresentação das notícias é altamente editorializada. O que eu quero dizer com isto é que parece haverem directivas claras sobre a forma e sobre o timing com que as notícias são apresentadas às audiências. Notar o facto perverso das notícias não serem censuradas. Em verdade ninguém pode dizer que a informação não é disponibilizada.

Corte com o passado

Os jornalistas seniores foram removidos das redacções. Isto permite por um lado poupanças nos respectivos salários, por outro lado lado resulta também numa nova geração de jornalistas mais fáceis de moldar pelos interesses de cada momento. Neste programa chamam-se os bois pelos nomes num raro momento de franqueza pública sobre estes assuntos.

39º Programa
Clube dos Jornalistas 
Emitido a 28 de Outubro de 2004 
Tema: "A Falta de Memória nas Redacções"


Moderador: Ribeiro Cardoso

Convidados:
Baptista Bastos -- Jornalista e Escritor
João Mesquita -- Jornalista
António Rêgo Chaves -- Jornalista

Depoimentos:
António Peres Metelo -- Jornalista
Rogério Vidigal -- Jornalista
Ana Sousa Dias -- Jornalista
Serafim Lobato -- Jornalista

Ataque ao barco para a faixa de Gaza

Por exemplo em 30 de Maio de 2010, um comboio com ajuda humanitária que se dirigia a Gaza foi atacado cerca das 23:00 UTC (mais uma hora em Portugal) por forças Israelitas, em alto mar. As fontes de informação internacional começaram durante a madrugada a dar conta do que se estava a passar. No entanto às 9:00 em Portugal havia poucas fontes a darem destaque à notícia.

Eis algumas primeiras páginas desse dia:

Imprensa Internacional

Imprensa Nacional

É estranho que uma notícia desta magnitude não tenha merecido desde o principio o devido destaque. Julgo que isto pode servir de indicio da manipulação dos media.

Divulgação dos "Diários de Guerra"

Outro exemplo claro de editorialização. A organização Wikileaks divulgou no dia 25 de Julho às 21:22 um volume massivo de informação sobre as operações das forças americanas no Afeganistão que convencionou chamar "Diários de Guerra" (também são referidas forças da NATO ou Afegãs quando há contacto destas com as tropas americanas). Nestes diários de Guerra é mostrada não só a crua realidade de um conflito armado (mortes de civis, crueldade, etc) como também a ajuda que o Paquistão dá aos talibãs ou a falta de respeito que as tropas americanas têm pelos afegãos, etc. É mostrada uma guerra que se está a perder.

Obviamente que tendo Portugal forças envolvidas no conflito seria de esperar que esta notícia tivesse destaque de primeira página desde o inicio, como teve nos principais meios de comunicação mundiais. Não foi esse o caso. Às 11:00 do dia 26 de Julho o assunto não era sequer referido pela maior parte dos meios de comunicação e quando o era fazia apenas menção a um comunicado da Casa Branca que condena a divulgação deste tipo de informação (achei essa notícia na TSF, Sol e TVI 24 com o texto praticamente igual).

Imprensa Internacional

Imprensa Nacional

Descida do rating da Irlanda

No dia 24 de Agosto o rating de crédito da Irlanda foi cortado pela S&P. Isto aconteceu por volta da 22 horas. Essa informação às 2:26 do dia 25 ainda não tinha aparecido na imprensa em Portugal de todo. Inclusive à meia noite o Expresso fez sair a seguinte notícia, que chega a ser anedótica:

Os "fundamentais" da Irlanda são mais sólidos

Redacção da Constituição Islandesa

A Islândia, em meados de 2011, iniciou a redacção de uma nova constituição na sequência da bancarrota e da falência do respectivo sistema político. Esta constituição está a ser feita por um Conselho Constitucional que estão, activamente, a consultar directamente a população. Esta notícia, merecedora de grande destaque numa altura em que se discute os processos de democracia directa até ao dia 16 de Junho de 2011 apenas tinha uma menção em jornal main stream:

• Redes sociais, a ferramenta escolhida pela Islândia para criar uma nova Constituição

  • Data: 2011.06.16
  • Fonte: i-online
  • Autor: Joana Azevedo Viana

  • Analistas apontam riscos de usar a internet num processo tão "complexo" Uma Constituição colaborativa e que espelhe as vontades da população islandesa é a premissa que levou o Conselho Constitucional - formado por 25 islandeses sem filiação partidária, eleitos depois do aval da Coligação que governa o país actualmente - a criar uma página de Facebook, onde os islandeses podem acompanhar a evolução das alterações à Constituição actual, bem como sugerir cláusulas para o documento.

Notar que esta notícia estava disponível no feed do jornal às três da manhã. Ou seja, ainda durante a manhã a notícia perdeu destaque ficando assim, para todos os efeitos, invisível.

Outra forma de Manipulação

Já vimos que se pode dar ou tirar importância a uma notícia simplesmente controlando o timing e a persistência em que esta permanece no ar. Outra forma de manipulação é exemplificada por esta notícia:

• Etarras presos confirmam ter recebido treino na Venezuela

  • Data: 2010.10.04
  • Fonte: Público
  • Autor: Público

  • Dois etarras presos no dia 29 de Setembro reconheceram, durante os interrogatórios, que em 2008 viajaram até à Venezuela para fazer um curso de armamento – é a prova de que a ETA se treina naquele país, de acordo com documentos da investigação judicial tornados públicos hoje Juan Carlos Besance ey Xabier Atristain foram presos em Guipuzcoa, no País Basco, numa operação em que foram apreendidos 100 quilos de explosivos.

A associação imediata que se faz ao ler o título desta notícia, é a associação do treino de terroristas ao Presidente Hugo Chavez ou ao Governo Venezuelano. No entanto no próprio artigo se diz que os terroristas também admitiram ter tido treino em França, não só este facto não é chamado ao título do artigo, como se torna impossível suspeitar que o Governo Francês ande a treinar a ETA.

Ainda neste artigo se escreve o seguinte:

• Disseram ter recebido treino em França e na Venezuela, entre Julho e Agosto de 2008, e que foram recebidos por Arturo Cubillas Fontán, já acusado por um outro juiz, em Março passado, de ser o intermediário entre a ETA e o próprio Governo venezuelano, adianta a edição online do jornal “El País”.

Repare-se no seguinte:

• Na mesma frase citam-se as declarações dos terroristas (treino em França e na Venezuela)

• Cita-se um nome "Arturo Cubillas Fontán" sem especificar que se suspeita ser membro da ETA casado com uma Funcionária de um Ministério na Venezuela - sendo este o elo entre a ETA e o Governo Venezuelano;
• O autor do artigo cita declarações com dois níveis de redireccionamento "juíz não nomeado" → "El País" → Público;

• Uma investigação rápida deste caso, mostra que as provas encontradas são algo ténues, é muito fácil encontrar o Auto levantado pelo Juiz D. Eloy Velasco Nuñez onde se pode avaliar em primeira mão sem ser necessário citar intermediários.

A minha declaração de interesses neste caso é que não tenho simpatia particular nem pela ETA, nem pelo Governo Venezuelano, nem pelo Governo Espanhol. Posto isto, é evidente que esta notícia é uma peça de propaganda bastante evidente. É claro, pode tratar-se apenas de incompetência ou simples preguiça...

Artigos

• Não publicação de notícia leva a demissão de editor de política do Diário de Notícias

  • Data: 2011.02.09
  • Fonte: Público
  • Autor: Mariana Oliveira

  • David Dinis, editor de Política do jornal Diário de Notícias , demitiu-se do cargo em Janeiro em litígio com o director do diário, João Marcelino, que impediu a publicação de uma notícia sobre o facto da operadora de telecomunicações TMN ter destruído parte dos dados de tráfego telefónico de Armando Vara (ex-vice-presidente do BCP), de Rui Pedro Soares (ex-administrador da PT) e de Paulo Penedos (ex-assessor da PT), no âmbito do processo Face Oculta.

Intervenções directas

Testemunho de pressões que atentem à liberdade de expressão são muitas vezes dados em privado, mas raramente chegam às páginas dos jornais. Nesse aspecto Miguel Relvas (do XIX Governo Constitucional) é pródigo em notícias, suspeitas e denúncias:

• Suspensão do programa de opinião da Antena 1 "Este Tempo" - alegadamente após pressões do ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares;

• Ameaças a Maria José Oliveira, jornalista do público - apesar de terem havido denúncias concretas, apesar de ter havido admissão de alguns factos, tudo acabou em nada;

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